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É preciso fazer uma UPP ao contrário das encostas do Rio

POR BRUNO ASTUTO

Rio - Quem frequenta a Região Serrana desde sempre — como eu, que passei boa parte das férias da minha infância na cidade de Nova Friburgo, então posso falar — sabe que havia algo de podre no ar. Simplesmente porque as colinas verdes, cheias de árvores e flores frondosas, que davam aquele arzinho de ‘ufa, estou no campo’, desapareceram da paisagem, dando lugar a uma floresta de casas, prédios, barracos e mansões — Rio de Janeiro, enfim.

As encostas sempre foram frágeis, até mesmo com as árvores. Lembro que, quando chovia forte, quase não podíamos sair de casa, porque volta e meia rolava uma pedra ou se desmanchava uma terra, que impedia a passagem pela estrada. Essas miniavalanches eram sempre recebidas com muita festa, pois significavam que não poderíamos voltar ao Rio até que os caminhos fossem desbloqueados, portanto não poderíamos ir para a escola na segunda-feira.

O imenso campo onde colhíamos morangos em Friburgo hoje é um vistoso condomínio de mansões, erguido sobre uma propriedade cuja terra era frágil como farelo de pão. Teresópolis, então, nem se fala; antigo reduto chique das famílias tradicionais cariocas, na última vez em que estive lá, quase morri de depressão com o estado lamentável em que os sucessivos governos irresponsáveis deixaram o município. Terê, nossa amada Terê, virou um favelão; seu centrinho hoje é uma avenida larga e cosmopolita, com hipermercados, shoppings, comércio feio e gente saindo pelo ladrão.

E Petrópolis, então? Se D. Pedro II ressuscitasse hoje, tomaria medidas enérgicas para resgatar a tão amada cidade que carrega seu nome. Os ricos, claro, saíram correndo do centro e se instalaram nos arredores — Nogueira, Itaipava, Correas e Araras — e lá construíram mansões espetaculares cujas proporções desafiam qualquer noção elementar de engenharia. Uma delas é conhecida das revistas de decoração: foi erguida no sopé da montanha apoiada apenas num pilar, em linhas secas e aquele formato horroroso de caixote de concreto, como adoram os arquitetos moderninhos.

Aquela casa tradicional, sólida, com cortinas de tecido, chão de madeira que a empregada encera toda semana, rodeada por paredões de verde e hortênsias praticamente não existe mais. Deu lugar a condomínios com churrasqueira, centro aquático, prédios e estradas perigosas feitas nas coxas. E quase não se veem mais cavalos passando por elas; carros possantes e jipes do tamanho das ruas sobem e descem numa frequência assombrosa. Que saudade do tempo em que tínhamos que pegar uma carroça para ir até a beira da estrada comprar doces; e isso não aconteceu na Idade Média, é bom lembrar, mas nos anos 80.

Adorador do frio e do escapismo bucólico da Região Serrana, chorei profundamente quando as primeiras notícias da tragédia começaram a desabar em nossas cabeças semana passada. Trago na alma um amor profundo pela gente daquelas regiões, pessoas simples, desarmadas, apaixonadas por suas cidades. Penso nas famílias desabrigadas e naquelas destroçadas pela perda dos entes queridos. Penso também em Angra, a cidade desabada do ano passado, outra tragédia mais do que anunciada. Qual será a próxima vítima do descaso histórico dos governos?

É preciso fazer uma UPP ao contrário das encostas do Rio, uma desocupação imediata das áreas de risco. Trata-se de uma medida impopular e espantadora de votos, nós sabemos, mas ela não é nada perto dos efeitos que uma calamidade como a que aconteceu na Serra pode gerar. A nós resta mostrar solidariedade e enviar mantimentos, roupas, braços e dinheiro às vítimas e seus familiares. E cobrar uma nova postura dos governantes — quem colocou bandido feroz para correr feito ovelhinha no Alemão tem cacife e nosso total apoio para agir de verdade.

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Eduardo Trigo

Eduardo Trigo

De família friburguense, minha bisavó veio da Alemanha direto para a nossa Nova Friburgo, no começo do século XX. Prazer, me chamo Eduardo Trigo. Nasci na cidade do Rio de Janeiro e com 2 anos vim morar na Princesinha da Serra. São 26 anos vivendo e convivendo na cidade. Sou um apaixonado por animais. "Não compre, adote!" Sempre tive o pensamento para o coletivo. Desde muito cedo achei necessário externar algumas situações que a nossa população vive. E, andando pelas ruas da cidade sempre via uma situação que julgava ser algo que os nossos governantes poderiam resolver facilmente. Por isso, resolvi não ficar apenas nas lamentações e, em 2009, criei o Nova Friburgo em Debate, um espaço para a população Friburguense se unir e lutar pelos seus direitos. Apontando os problemas, mas também buscando soluções. Afinal Nova Friburgo, EU AMO, EU CUIDO!

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