Em Córrego Dantas, o caminhoneiro Joel Correia Baya, de 60 anos, passa os dias em alerta atrás do balcão do comércio simples que funciona no térreo de sua casa, de três pavimentos. O imóvel continua em área de risco, na base de um morro que, aparentemente, pode desabar a qualquer momento. O medo de Baya, entretanto, não é de ser atingido por uma avalanche numa área já condenada pela Defesa Civil. Seu temor é ser roubado.
— Não saio daqui de jeito nenhum. Nem para ir à cidade. Quem saiu perdeu tudo nos saques que acontecem a qualquer hora do dia — conta o caminhoneiro.
O bairro onde mora Baya foi um dos mais castigados de Nova Friburgo durante o temporal que atingiu a Região Serrana em 2011. Assim como o caminhoneiro, outros moradores voltaram para os seus imóveis após o governo do estado não cumprir a promessa de construir casas populares destinadas às famílias que deveriam deixar as áreas de risco dos municípios atingidos pela tragédia. Para piorar a situação, os moradores, quando retornaram, encontraram as residências saqueadas.
Casas liberadas pelo estado
Foi o que aconteceu com o comerciante Valtair Jordão Gonçalves, de 54 anos. Valtair conta que, na época da tragédia, ele foi retirado de casa juntamente com a mulher. As enchentes na região destruíram seu pequeno comércio. Praticamente falido e sem aluguel social, passou cerca de dois anos vivendo às custas do filho num imóvel alugado, também em Friburgo.
— Perdi tudo que tinha nas chuvas. Só sobraram três casas que eu havia construído e alugado aqui no bairro. A Defesa Civil e os técnicos do Instituto estadual do Ambiente (Inea) disseram que minhas casas estavam em área de risco e que iriam me indenizar. Mandaram eu sair — lembra Valtair.
Este ano, o quadro mudou. O comerciante afirma que procurou os representantes do governo para buscar informações sobre as indenizações. Soube, então, que suas casas haviam sido liberadas e que não estariam mais em áreas de risco. Com a mulher, voltou e teve uma surpresa:
— As casas tinham sido saqueadas. Roubaram tudo. Portas, janelas, pias e todos os fios da instalação elétrica. Até o vaso sanitário levaram. Agora, quem vai pagar o prejuízo?
As casas ainda estão em pé, num trecho da encosta onde outras foram arrastadas, sepultando famílias inteiras. O comerciante mostra rachaduras no piso e em parte da estrutura da varanda de um dos seus imóveis.
— Os representantes do governo do estado disseram que podemos voltar, que não estamos mais em área de risco. Mas é difícil acreditar com tantas rachaduras. Como não tenho para onde ir, eu voltei. Agora, quando chove muito e as sirenes tocam, eu saio — acrescenta Valtair.
Casado e pai de dois filhos, Marcos Antônio Thuler, de 45 anos, supervisor de qualidade, mas que está desempregado, também voltou a morar na sua casa, localizada numa encosta de Córrego Dantas onde várias desabaram.
— Não tenho para onde ir e o governo até hoje não voltou para me dizer nada. Quando teve a chuva, mandaram eu sair. Disseram que iriam indenizar, mas as promessas não foram em frente — afirma Thuler.
Imóveis para vítimas de Friburgo
O governo do estado informou que inaugurou, no dia 28 de maio, 50 casas pré-moldadas para famílias de Nova Friburgo que foram vítimas das chuvas. As moradias — de dois quartos e sala americana — foram construídas no Parque das Flores, distrito de Conselheiro Paulino. A previsão é erguer mais cem unidades no condomínio até o fim do ano.
Ainda segundo o estado, as moradias de Nova Friburgo são as primeiras das 694 casas pré-moldadas que serão construídas em sete municípios da Região Serrana contemplados pela parceria entre governo, prefeituras e 11 empresas privadas, que doaram cerca de R$ 40 milhões.
A Secretaria estadual de Obras garante que foram reconstruídas 40 pontes, sendo 14 em Nova Friburgo, seis em Bom Jardim, 12 em Sumidouro, e oito em Teresópolis, num valor total investido de R$ 4,4 milhões. Também em Friburgo, foram aplicados outros R$ 99 milhões em obras de contenção de encostas em 13 pontos do município.
A Região Serrana foi devastada em janeiro de 2011 por uma enxurrada que matou 918 pessoas, deixou cerca de 200 desaparecidos e mais de oito mil desabrigados. Sete municípios foram atingidos, no maior desastre natural do país, levando Friburgo, Teresópolis e Petrópolis a estado de calamidade pública. Outras quatro cidades também acabaram afetadas pela tragédia: Sumidouro, Areal, Bom Jardim e São José do Vale do Rio Preto.